Por Emerson Pereira – Foto Jean Victor/Prefeitura de Lauro de Freitas
Apesar de ser um dos municípios mais populosos da Região Metropolitana de Salvador (RMS) e com uma dinâmica urbana cada vez mais complexa, Lauro de Freitas continua sem um sistema de transporte público municipal estruturado, regulamentado e gerido localmente. O que se vê hoje é uma gestão marcada por omissão e conveniência, que empurra a responsabilidade para o governo estadual ao mesmo tempo em que tenta, por vias indiretas, exercer algum controle sobre o que não lhe compete oficialmente.
Atualmente, 14 linhas que circulam apenas dentro do território de Lauro de Freitas são enquadradas como linhas metropolitanas e estão sob responsabilidade da Agerba (Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos). Essas linhas ligam bairros da cidade ao Terminal Aeroporto, localizado no limite com Salvador. Na prática, essas rotas funcionam como linhas urbanas, mas por conveniência histórica e administrativa permanecem classificadas como metropolitanas, o que transfere a responsabilidade de fiscalização, regulamentação e concessão para o Governo do Estado.
Confira as linhas circulam exclusivamente dentro de Lauro de Freitas que hoje são consideradas metropolitanas:
840 – Terminal Aeroporto x Vilas do Atlântico
840I – Terminal Aeroporto x Solar de Vilas
854 – Terminal Aeroporto x Portão
855 – Terminal Aeroporto x Jambeiro
855I – Terminal Aeroporto x Areia Branca
858A – Terminal Aeroporto x Praia de Ipitanga (via Amarílio Thiago)
858A2 – Terminal Aeroporto x Praia de Ipitanga (via Praça Arcanja)
883 – Terminal Aeroporto x Vida Nova (via Terraplac)
883A – Terminal Aeroporto x Vida Nova (via Portão)
883A3 – Terminal Aeroporto x Vida Nova (via Parque São Paulo)
883A3E – Terminal Aeroporto x Parque São Paulo
883E – Terminal Aeroporto x Conjuntos Lindu / Brisas (via BA-099)
883E2 – Terminal Aeroporto x Conjuntos Lindu / Brisas (via Caic)
937 – Terminal Aeroporto x Buraquinho
855A3 – Terminal Aeroporto x Hospital Metropolitano (via Quingoma)
Em paralelo, as linhas interbairros — que deveriam constituir um sistema urbano complementar — estão sob a gestão de cooperativas locais e operam com microônibus de forma descentralizada. Esse subsistema é frequentemente alvo de críticas por parte dos moradores, que reclamam da falta de regularidade, precariedade dos veículos e ausência de fiscalização efetiva.
Incoerência institucional

O ponto mais preocupante dessa situação é a incoerência institucional. A Secretaria Municipal de Trânsito, Transporte e Ordem Pública de Lauro de Freitas tem promovido ações de fiscalização sobre os ônibus metropolitanos no Terminal Aeroporto — mesmo sem ter competência direta sobre essas linhas. Além disso, a própria gestão municipal tem se envolvido em solicitações de ajustes de horários, itinerários e até na cobrança por melhorias no atendimento, assumindo uma responsabilidade que formalmente é do governo estadual.
Essa ambiguidade administrativa gera zonas cinzentas na governança do transporte público, deixando o cidadão sem clareza sobre a quem recorrer diante de problemas, atrasos ou más condições no serviço.
Vale lembrar que essa não é uma exclusividade da atual gestão municipal. A falta de um sistema urbano de transporte público é um problema crônico, herdado de administrações anteriores, que preferiram não assumir a responsabilidade pela mobilidade local, mesmo diante do crescimento populacional e do aumento da demanda por um transporte mais eficiente e integrado.
Hoje, as linhas que ligam bairros de Lauro de Freitas ao Terminal Aeroporto contam com uma frota de mais de 60 ônibus convencionais, todos operando com características de transporte urbano, mas sob a roupagem jurídica de um sistema metropolitano. Esse descompasso trava avanços importantes, como a criação de bilhetagem unificada, integração plena com modais como o metrô e melhorias diretas sob gestão municipal.
Para mudar esse cenário, Lauro de Freitas precisaria dar um passo político e administrativo importante: criar e regulamentar seu próprio sistema de transporte público urbano, assumindo de fato o papel de gestora da mobilidade no território municipal. Isso incluiria incorporar as linhas hoje “emprestadas” pela Agerba, licitar operadores, fiscalizar o serviço e pensar em integração tarifária e modal com Salvador e a RMS.
Enquanto isso não acontece, a população segue refém de um modelo fragmentado, sem clareza de responsabilidades e com pouca eficácia prática, onde cada instância de poder se posiciona conforme a conveniência, mas nenhuma assume integralmente a tarefa de oferecer um transporte público digno para quem mais precisa.