Transporte por ônibus perde mais de 19 milhões de passageiros no Brasil em uma década

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Por Emerson Pereira – Foto José Cruz

O transporte coletivo urbano por ônibus enfrenta uma das maiores crises de sua história no Brasil. De acordo com o Anuário NTU 2023-2024, produzido pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), o país registrou uma queda de 44,1% no número de passageiros pagantes em dez anos. Em 2023, os ônibus urbanos transportaram 19,1 milhões de pessoas a menos por dia em comparação a 2014.

O declínio se acentuou durante a pandemia e não voltou aos patamares anteriores: em relação a 2019, a demanda caiu 25,8%. Em outras palavras, um em cada quatro passageiros deixou de usar o transporte público por ônibus nos últimos quatro anos. A mudança de hábitos, o crescimento do e-commerce, a adoção do home office e a priorização do transporte individual estão entre os principais fatores para a redução.

Os sistemas analisados pela NTU incluem Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo — responsáveis por cerca de um terço da frota nacional, estimada em 107 mil veículos. O levantamento também aponta que a idade média da frota nacional atingiu 6 anos e 5 meses em 2023, o maior índice já registrado. A média ideal seria de 5 anos.

Para o urbanista Roberto Andrés, o impacto da queda de usuários vai além da mobilidade. “Essas pessoas que saíram dos ônibus foram, então, para o automóvel e motocicleta, próprios e de aplicativos, aumentando trânsito, poluição e acidentes. Ou, pior ainda, elas não conseguem mais se deslocar”, pontua.

A consequência é visível nas ruas: enquanto um ônibus convencional transporta, em média, 70 passageiros, e um articulado comporta 126, os carros e motos circulam quase vazios. Segundo a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), a média nacional é de apenas 1,5 pessoa por automóvel e 1,1 por motocicleta. Dados do Ministério dos Transportes mostram que o Brasil conta atualmente com 127,7 milhões de veículos, sendo 64,2 milhões de automóveis (50,3%) e 29,4 milhões de motocicletas (23,1%).

Belo Horizonte, por exemplo, soma 2,79 milhões de veículos — o equivalente a 1,2 por habitante. A frota nacional de motocicletas cresceu 42% em dez anos, chegando a 35 milhões de unidades em 2024, de acordo com a Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas (Abraciclo). O país é hoje o sexto maior fabricante de motos do mundo, produzindo cerca de 1,8 milhão por ano. Mais de 40 milhões de brasileiros estão habilitados a pilotar motocicletas, com destaque para o aumento expressivo nas regiões Norte e Nordeste. Nos últimos dez anos, Alagoas, Amazonas e Bahia registraram as maiores altas de habilitações para motos, com crescimentos de 86,3%, 79,7% e 62,6%, respectivamente.

Em Salvador, o cenário é ainda mais preocupante. Além da queda no número de passageiros transportados, a cidade perdeu um dos seus principais operadores: o Consórcio Salvador Norte (CSN), cuja saída resultou na retirada de quase mil ônibus da frota convencional. A capital baiana, que já enfrenta uma das tarifas mais caras do país — atualmente R$ 5,60 —, viu o sistema encolher e a oferta de transporte se tornar mais limitada, agravando a exclusão de quem depende do serviço.

A crise do transporte coletivo, portanto, não é apenas uma questão operacional, mas social e ambiental. Com menos ônibus circulando e mais veículos individuais nas ruas, o custo da mobilidade recai cada vez mais sobre o bolso e o tempo da população.

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