Tarifa Zero gera reação: ex-secretário questiona proposta em Salvador

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A proposta de “Tarifa Zero” no transporte público de Salvador, defendida publicamente pelo vereador Hélio Ferreira (PCdoB), tem provocado críticas contundentes de especialistas da área. Entre os principais opositores está Fabrizzio Muller, ex-secretário de Mobilidade de Salvador e ex-vice-presidente nacional do Fórum de Secretários de Mobilidade, que classificou a proposta como incompatível com a realidade financeira e operacional da cidade.

Segundo Muller, o vereador desconsidera pontos estruturais que tornam o projeto inviável — sendo o principal deles a ausência de uma fonte de financiamento clara e sustentável. “Atualmente, o sistema já consome cerca de R$ 1 bilhão por ano. Com a gratuidade total, esse valor pode aumentar entre 30% e 50%, exigindo mais frota, mais motoristas, manutenção e infraestrutura”, alertou.

O vereador afirma que haverá geração de empregos e inclusão social, especialmente para os 30% da população que hoje não utilizam transporte público por falta de recursos. No entanto, ele não explica como o município, sozinho, poderia arcar com o aumento de despesas em um cenário onde o orçamento municipal já está comprometido com serviços essenciais como saúde, educação e obras pública.

Além disso, ao prometer um transporte gratuito, com mais ônibus e com qualidade superior — inclusive com câmeras de reconhecimento facial —, o vereador esquece de mencionar que tais melhorias demandam investimentos adicionais de grande monta. Não basta simplesmente colocar mais ônibus nas ruas: é preciso garantir infraestrutura, manutenção, segurança e condições dignas de trabalho para os operadores.

Como destaca Fabrizzio Muller, uma atuação mais responsável do parlamentar seria buscar formas concretas de reduzir o custo da tarifa, sem prometer a sua extinção de maneira irresponsável. “O vereador poderia colaborar para sensibilizar o governo estadual a reduzir o ICMS sobre peças e, principalmente, sobre os combustíveis do transporte coletivo. Isso já contribuiria significativamente para a redução da tarifa”, disse Fabrizzio.

Além disso, existem alternativas mais realistas, como a busca por receitas extra tarifárias e extra orçamentárias, através de parcerias público-privadas, concessões, publicidade ou taxação de setores que se beneficiam diretamente da mobilidade urbana. Essas são soluções que diversas cidades no mundo vêm adotando para subsidiar parcialmente as tarifas, sem comprometer a sustentabilidade fiscal dos municípios.

A ideia de que a tarifa zero será o “futuro das grandes metrópoles”, como sugere o vereador, é uma generalização precipitada. Existem pouquíssimos exemplos bem-sucedidos de cidades de grande porte que conseguiram implantar a tarifa zero de forma permanente e sustentável. Em geral, essas experiências ocorrem em municípios de pequeno ou médio porte, com sistemas de transporte menos complexos e custos mais baixos.

Mais do que lançar propostas de apelo popular, é preciso que os legisladores assumam um compromisso com a responsabilidade fiscal e com a sustentabilidade dos serviços públicos. A população de Salvador merece, sim, um transporte público acessível, eficiente e seguro — mas para isso é necessário planejamento, diálogo técnico e político, e não discursos fáceis que ignoram a realidade das finanças públicas.

A proposta do vereador Hélio Ferreira pode até inspirar um debate necessário sobre a mobilidade urbana, mas, na forma como foi apresentada, carece de fundamentação técnica, financeira e jurídica. Mais que prometer transporte gratuito, é fundamental construir soluções reais para melhorar o transporte público e garantir que ele seja acessível e eficiente para toda a população.

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